quinta-feira, 23 de outubro de 2008

berto Garuti

Miséria
ee fome no BRAS
Revista "MUNDO e MISSÃO"

Fome


Dos 32 milhões de pessoas que passam fome no Brasil, metade vive no meio rural e outros 65 milhões alimentam-se de forma precária

O Brasil pode, sozinho, vencer o desafio da fome, marginalização e miséria, dizem os bispos.
E apontam o caminho

Alberto Garuti

CNBB propõe
mutirão nacional

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) editou, em sua última reunião geral, no mês de abril deste ano, um documento intitulado "Exigências evangélicas e éticas de superação da miséria e da fome" no qual se afirma que "escandaliza-nos o fato de saber que existe alimento suficiente para todos e que a fome se deve à má repartição dos bens e da renda".

DADOS E ESTATÍSTICAS

Um relatório elaborado pelo Centro de Justiça Global, pela Comissão Pastoral da Terra e pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra prova a verdade da afirmação da CNBB. Por esse documento ficamos sabendo que o grau de concentração de terra no Brasil é um dos maiores do mundo.

Menos de 50 mil propriedades rurais possuem áreas superiores a mil hectares e controlam 50% das terras cadastradas. Cerca de 1% dos proprietários rurais detêm em torno de 46% de todas as terras. Dos aproximadamente 400 milhões de hectares reconhecidos como propriedade privada, apenas 60 milhões são utilizados para lavoura. As terras restantes estão ociosas, sub-utilizadas, ou destinam-se à pecuária.

Segundo o censo de 1995, existem cerca de 4,8 milhões de famílias de trabalhadores rurais "sem terra", que vivem em condições de arrendatários, meeiros, posseiros, ou com propriedades de menos de 5 hectares.

O QUE AS TERRAS PRODUZEM

O Brasil produz apenas 75 milhões de toneladas de grãos por ano. Esse número é quatro vezes menor do que a média da produção em países com condições climáticas e de solo iguais ou piores. Segundo o Censo Agropecuário, entre 1985 e 1996, as áreas com lavoura permanente foram reduzidas em 2 milhões de hectares, e as com lavouras temporárias em 8,3 milhões de hectares. De 1980 a 1996, a área cultivada reduziu em 2% e a população aumentou em 34%. Na década de 80, o Banco do Brasil investia em torno de 19 bilhões de dólares na agricultura. Entre 1994 e 1998, a média de financiamentos foi de 6 bilhões de reais por ano.

OS QUE TRABALHAM A TERRA

De acordo com o censo de 1995, existem cerca de 23 milhões de trabalhadores no meio rural, e deles somente 5 milhões são classificados como assalariados rurais. Cerca de 65% desses assalariados não possuem carteira assinada e apenas 40% possuem trabalho o ano todo. Muitos desses trabalhadores chegam a trabalhar até 14 horas por dia. Nesse contexto, mulheres e crianças são as mais vulneráveis. A maioria das mulheres realiza dupla jornada, dedicando-se a trabalhar a terra e às tarefas domésticas. Cerca de 4 milhões de crianças trabalham no meio rural e somente 29% delas recebem remuneração. Entre as crianças de 5 a 9 anos, somente 7% recebem remuneração e um grande número não têm acesso à educação.

AS CONDIÇÕES DE QUEM TRABALHA NA TERRA

Entre 1980 e 1996, a renda média de todos os agricultores diminuiu 49%. Enquanto as melhores terras destinam-se à monocultura de cultivos para a exportação, como café, cana, algodão, soja e laranja, 32 milhões de pessoas passam fome no País e outros 65 milhões alimentam-se de forma precária. Desses 32 milhões que passam fome, metade vive no meio rural. Isso explica a migração para a cidade, que aumentou visivelmente nos últimos 30 anos. Os trabalhadores rurais diminuíram em 23%, de 1985 a 1996. Hoje mais de 77% da população brasileira vive nas cidades.
Por isso a concentração de terras tem aumentado muito nestes últimos anos. As propriedades acima de 2 mil hectares passaram de 10.977 em 1992 para 27.556 em 1998, isto é, aumentou o número dos grandes fazendeiros.

A CNBB PRONUNCIA-SE SOBRE MISÉRIA E FOME NO BRASIL

Em seu último documento a CNBB afirma que o Brasil tem a possibilidade de vencer esse grande desafio. É um problema que o Brasil pode superar sozinho...

" temos recursos e tecnologia para vencer a fome. Falta-nos o espírito solidário e evangélico para renunciar a privilégios e libertar-nos do vírus do egoísmo. Falta-nos, ainda, decisão política(...) Temos capacidade de produzir alimento bastante para o consumo interno.e para a exportação. A combinação das redes pública e particulares de armazéns é capaz de atingir toda a população, em qualquer parte do Brasil.

Apesar disso, existe gente passando fome porque a renda familiar não permite comprar a comida que o mercado oferece. As raízes da fome estão, especialmente, na distribuição iníqua da renda e das riquezas, que se concentram nas mãos de poucos, deixando, na pobreza, enormes contingentes populacionais nas periferias urbanas e nas áreas rurais...à condição que haja solidariedade e simplicidade.

Continuam os bispos dizendo que "da afirmação da dignidade do ser humano decorre, também, o princípio ético da solidariedade". Princípio esse que "não pode ser confundido com certas práticas de assistência que humilham quem recebe. É preciso aprender a lição de ética que dá o povo da rua quando reparte o pouco que tem, para que todos sobrevivam. Essa ética particular, com mais razão, interpela a sociedade a repartir a abundância para que todos vivam humanamente, hoje e no futuro". Da afirmação da dignidade humana decorre também a exigência da simplicidade. (...) Precisamos abdicar do sonho consumista, ilusoriamente inculcado pela propaganda e implementar uma globalização solidária, a partir de um estilo de vida inspirado no Evangelho.

PROPOSTAS CONCRETAS

Reconhecem os bispos que a própria "Constituição 'Cidadã' de 1988 inova, em seu Preâmbulo, ao tratar da erradicação da pobreza e da marginalização", mas, infelizmente, temos ainda "um longo caminho a percorrer, pois, os governos pouco fizeram no campo dos direitos sociais, conformando-se antes a uma agenda monetarista e colocando a política financeira acima do desenvolvimento da cidadania".

"Garantir o alimento para todos, superando a miséria e a fome, exige de cada um de nós o engajamento pessoal. Mais do que isto, supõe a experiência pessoal do humilde e corajoso processo de gestação de uma nova sociedade, que atenda aos direitos e às necessidades básicas da população: educação, saúde, reforma agrária, política agrícola, demarcação das terras indígenas e das terras remanescentes dos quilombos, distribuição de renda, reforma fiscal e tributária, moradia. Exige também que desenvolvamos novas relações de trabalho e de gestão da empresa, criando uma economia de comunhão comprometida com a solidariedade e atenta às exigências da sustentabilidade".

Para isso a CNBB lança o Mutirão Nacional para a Superação da Miséria e da Fome, convidando "Dioceses em seus diversos níveis de organização" para que "sejam convidadas pessoas da própria comunidade eclesial a fim de formar grupos" que assumam esse Mutirão. Essa é uma resposta ao imperativo do Evangelho. Antes da multiplicação dos pães, Jesus disse aos apóstolos:
"Dai-lhes vós mesmos de comer" (Mc 6,37).

Sobre as atualizações dos dados contidos nesta página, ver "Uma palavra em 2004".

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Como todas as outras desgraças que se abatem sobre a humanidade, também essas duas só puderam surgir por obra dela própria. Jamais esteve previsto nas determinações do Criador que o ser humano conhecesse privações e penúrias materiais durante sua passagem pela Terra.

Por isso, quem voluntariamente se priva de alimento ou rejeita bens materiais, na ilusão de assim progredir espiritualmente ou mesmo de agradar a Deus, age contra a Vontade Dele, isto é, peca e se sobrecarrega com uma grave culpa. É preciso ser realmente muito arrogante, vaidoso e presunçoso, e também especialmente tolo, para imaginar que o Criador de Todos os Mundos possa interessar-se, ou até alegrar-se, pelo fato de um ser humano não cuidar de seu corpo como deveria. Jejuns piedosos e votos de pobreza nada mais são do que testemunhos de estupidez e vaidade ilimitadas.

Mas deixemos de lado essas tolices e examinemos a fome e a miséria quando se abatem como pragas apocalípticas (que de fato são) sobre povos inteiros.

Como todos os outros sinais do Juízo, também este não desperta mais do que uns poucos comentários de lamento e de desagrado durante os noticiários televisivos noturnos. Cenas de mães e filhos esquálidos, envoltos em trapos e rodeados de moscas, já se tornaram comuns e não chocam tanto. Às vezes, um ou outro artista lança uma campanha para se angariar fundos de ajuda, com o objetivo de amainar aquele sofrimento todo, mas logo depois tudo já está esquecido. Passam-se alguns meses e repetem-se as mesmas cenas, em alguma outra parte do mundo; as pessoas fazem os mesmos comentários de desaprovação, para esquecerem tudo novamente poucos dias depois.

Quem, realmente, se pergunta pela causa verdadeira da fome e da miséria no mundo, que cresce a olhos vistos?

Sociólogos, antropólogos e economistas têm-se debruçado sobre a questão há décadas, sem estabelecerem um consenso sobre as causas desses males e, menos ainda, como é notório, em relação às providências para sua erradicação.

Esses estudiosos chegaram a algumas conclusões que podem ser classificadas como diagnósticos parciais do problema. Nesse sentido, os trabalhos até agora desenvolvidos têm de fato uma importância bastante grande, já que nos permitem visualizar com maior clareza os efeitos terrenos do atuar errado da criatura humana. Contudo, também eles não apontam as causas reais da fome e da miséria no mundo.

No ano de 1798, o economista inglês Thomas Malthus publicou uma obra intitulada Ensaio Sobre o Princípio da População. Nesse trabalho, Malthus afirmava que a produção de alimentos no mundo crescia em progressão aritmética, enquanto que a população crescia em progressão geométrica. A conseqüência inevitável dessa desproporção seria pobreza crescente e fome permanente. Quando essa situação chega a extremos, a própria natureza interviria, por meio de pestes, epidemias e guerras, restabelecendo o equilíbrio. Essa é a razão, segundo os adeptos do malthusianismo, de a fome e a miséria ainda não terem atingido integralmente todos os povos da Terra.

No que essa teoria está certa, e no que ela está errada?

Quando Malthus lançou o seu ensaio, havia cerca de um bilhão de pessoas vivendo na Terra. Passados 150 anos, logo após o término da Segunda Guerra Mundial, o mundo havia ganho outro bilhão de habitantes. No início de 1992 a população mundial já atingia 5,5 bilhões de pessoas, num ritmo de crescimento de um bilhão de pessoas (quase uma China) por década.

Malthus, portanto, estava certo sobre a velocidade do crescimento da população mundial. Seu erro, porém, foi considerar essa taxa de crescimento como um parâmetro normal da natureza, isto é, apenas constatar, considerando como natural, a velocidade do crescimento populacional.

Nunca esteve previsto, de maneira alguma, que a Terra tivesse de abrigar uma tal quantidade de criaturas humanas, muito menos ainda que o ritmo de crescimento populacional fosse o que atualmente se verifica1.

Para não errar de antemão em qualquer análise dos problemas que cercam a vida de hoje, o pesquisador precisa partir de dois princípios básicos:

1º Princípio: As Leis que governam a Criação são perfeitas, porque foram instituídas pelo Criador.

Por serem perfeitas, os efeitos dessas Leis, quando se as compreende corretamente e se vive de acordo com elas, só podem ser benéficos. Jamais darão ensejo a algo insano, como desequilíbrios, injustiças e arbitrariedades.

2º Princípio: O ser humano age segundo o seu livre-arbítrio.

É característica própria do espírito humano a possibilidade de atuar segundo sua própria vontade. Se, voluntariamente, direcionar essa sua vontade pessoal segundo o que estipula as Leis perfeitas da Criação, então não poderá receber outra coisa senão alegria e felicidade. Mas, se ao contrário, apesar de todos os auxílios e advertências, insistir em dirigi-la em sentido diferente do preconizado por essas mesmas Leis, só poderá encontrar dor, sofrimento e destruição. Destruição automática de suas obras erradas e, por fim, destruição dele próprio, como um elemento nocivo na Criação, caso não mude em tempo a direção que dá à sua vontade, ao seu livre-arbítrio.

Com base nesses dois princípios básicos, podemos afirmar com segurança que a explosão populacional não é um acontecimento natural, sadio, mas sim fruto de alguma atuação errada da humanidade, já que se trata de um desequilíbrio.

Qual seria então a causa do crescimento vertiginoso do número de habitantes sobre a Terra?

Em primeiro lugar, foram as já mencionadas repetidas reencarnações terrenas, decorrência da decadência espiritual das criaturas humanas, que cada vez mais se tornavam escravas do seu intelecto, só vendo valor nas coisas materiais. Como não podiam mais ascender a outros planos após um certo número de reencarnações, elas continuaram a voltar sempre de novo aqui para a matéria grosseira, e a Terra foi se enchendo cada vez mais.

Além disso, com a decadência progressiva, tornou-se possível que almas cada vez piores pudessem se encarnar na Terra. Tratavam-se de espíritos muito decaídos, que viviam em mundos do além situados muito abaixo da Terra. Através de pontes lançadas pelo mau querer dos seres humanos terrenos, esses espíritos decaídos puderam subir até aqui e se encarnaram, algo que absolutamente não estava previsto para eles. Assim, chegou-se hoje à situação em que a maior parte dos habitantes do planeta sequer pertencem de fato à Terra. Vivem aqui agora, causando danos, por culpa da própria humanidade que foi ao encontro deles e lhes estendeu a mão. É essa também uma das razões do aumento da criminalidade. Maior número de pessoas más, maior quantidade de ações más.

Mas voltemos a Malthus. Como ele apenas constatou o ritmo vertiginoso de crescimento populacional, considerando-o natural, supôs que a natureza se encarregaria de manter o equilíbrio através de doenças e fome, eliminando dessa forma o excesso de pessoas. Tal efeito, no entanto, seria um ato arbitrário da natureza, se o crescimento acelerado da população fosse realmente "normal". Pois, dessa forma, pessoas inocentes teriam de passar necessidades e morrer para que outras sobrevivessem.

Porém, como as Leis da Criação são perfeitas, fica excluída completamente a possibilidade de uma injustiça qualquer. A fome e a miséria que assolam hoje o mundo são apenas o efeito retroativo da má vontade humana. Uma criança que nasce numa família miserável, em qualquer parte do mundo, não é inocente. Pelo contrário. É tão culpada que só pôde encarnar num ambiente assim degradado. Não é sem razão que seis de cada sete novos habitantes do globo vêm de países subdesenvolvidos.

Também a miséria e a fome têm, no Juízo Final, um efeito saneador. Ou servem para que os atingidos por elas possam remir uma culpa, caso cheguem ao reconhecimento de que a situação em que se encontram é fruto de sua própria atuação, ou agem como mais um mecanismo de limpeza no Juízo, ao livrar a Terra de espíritos profundamente decaídos, que nela só podem causar danos ao seu ambiente e a si próprios.

O argumento dos não-malthusianos para explicar a fome e a miséria são também bastante interessantes. Porém, assim como os dos malthusianos, não esclarecem as verdadeiras causas dessas desgraças.

Os não-malthusianos dizem que até agora o aumento da população no mundo esteve abaixo da produção de alimentos. O problema da fome seria, portanto, a má distribuição dos alimentos, ou, melhor dito, a má distribuição de renda nos países e no mundo, causa também da miséria crescente. Em suma, a miséria e a fome seriam males oriundos do sistema capitalista, que só permite a quem ganha dinheiro manter-se bem alimentado e desfrutar de uma vida digna. Alguns fatos ilustram essa situação em relação ao consumo de alimentos no mundo:

  • Enquanto o consumo diário médio de calorias no mundo desenvolvido é de 3.315 calorias por habitante, no restante do globo o consume médio é de 2.180 calorias diárias por habitante.
  • Metade dos habitantes da Terra ingere uma quantidade de alimentos inferior às suas necessidades básicas.
  • A quarta edição do Inquérito Mundial sobre Agricultura e Alimentação, patrocinado pela ONU em 1974, concluiu: "Em termos mundiais, a quantidade de alimentos disponíveis é suficiente para proporcionar a todo mundo uma dieta adequada."
  • Em 1976, ano que os Estados Unidos venderam 25 milhões de toneladas de cereais para a União Soviética, um recenseamento mostrou que 12% dos americanos, num total de 26 milhões de pessoas, viviam em "estado de pobreza", muitos dos quais sofrendo carências alimentares graves.
  • Dividindo-se o total da produção de alimentos na América Latina pelo total da população, chega-se à uma média bastante razoável de 2.525 calorias por habitante. No entanto, a imensa massa de famintos no continente demonstra que poucos ingerem muitas calorias e muitos ingerem poucas calorias. Entre 1990 e 1994, o contingente de miseráveis passou de 197 milhões para 209 milhões, segundo informe do Órgão da ONU Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).
  • Cerca de um terço da população do mundo ingere 65% dos alimentos produzidos.
  • O valor da tonelada de trigo no mercado internacional passou de 50 dólares em 1965 para mais de 200 dólares em 1996. No mesmo período, o arroz variou de 150 dólares para mais de 350 dólares.

Esses dados mostram que os alimentos produzidos no mundo poderiam alimentar a população mundial, mas somente quem pode pagar por eles é que se alimenta adequadamente2. Como a concentração de renda é uma constante em todo o mundo (conforme demonstrado no tópico Economia) cada vez mais pessoas descem ao nível da pobreza absoluta, não dispondo mais dos meios para adquirir os alimentos, enquanto que os que já eram miseráveis permanecem nessa situação.

Essa é, segundo os não-malthusianos, a verdadeira causa da fome e da miséria no mundo. Um representante dessa linha de pensamento chegou a afirmar que "a subnutrição de massa só será um velho capítulo na história da humanidade a partir do momento em que os pobres tiverem condições de exigir e obter aquilo a que têm direito no conjunto da produção nacional e internacional."

A busca de lucro a qualquer preço e a acentuada concentração de renda constatada em todo o mundo nas últimas décadas não são as causas reais da fome e da miséria no mundo, mas, ao contrário, assim como estes, são também efeitos retroativos da má vontade humana. São os frutos que têm de ser colhidos agora, depois de uma longa e persistente semeadura má. Se a concentração de renda em nível mundial, que cresce continuamente, faz crescer a fome e perpetua a miséria, então isso significa que ela é um dos mecanismos terrenamente visíveis para fazer retornar aos povos os efeitos de seus carmas coletivos. Os outros mecanismos são as guerras e os regimes políticos.

Tudo hoje é efeito retroativo. Os povos que tiveram de experimentar o comunismo nesse nosso século, por exemplo, não foram acaso vítimas inocentes das circunstâncias. Em outras vidas aquelas pessoas apoiaram concepções erradas sobre uma pretensa igualdade social e fomentaram o inconformismo em relação à isso. Agora, receberam os frutos de suas ações de outrora. Através da vivência amarga dentro de um regime político insano e tirânico, muitos puderam reconhecer o quanto de doentio existe na tentativa de forçar uma igualdade impossível entre os seres humanos, tão diferentes entre si em seus desenvolvimentos terrenais, anímicos e espirituais.

Com os males do regime capitalista não é diferente. Tudo hoje está torcido. A produção e comercialização de alimentos visa, única e exclusivamente, o lucro. Seja na definição da área plantada e do tipo de cultura desenvolvida (segundo perspectivas de "preço de mercado") ou através de práticas empresariais repulsivas, como fazer galinhas ingerirem produtos químicos para tornar os ovos mais amarelos ou passar frutas através de raios X, para que as sementes morram e a concorrência não possa utilizá-las...

As tentativas de se entender e resolver os graves problemas humanos apenas com o intelecto, sem procurar conhecer suas causas mais profundas, redunda infalivelmente em fracasso e confusão. Uma amostra disso foi a chamada "Revolução Verde", que granjeou para o seu idealizador, um agrônomo americano, o Prêmio Nobel da Paz de 1970.

A idéia dessa revolução era de que não há melhor remédio para a fome e a miséria do que o progresso. De acordo com esse conceito, fome e miséria seriam erradicadas dos países pobres desde que se adotassem técnicas de produção adequadas.

A base de tudo eram sementes selecionadas, produzidas em laboratório, também chamadas de "variedades de alto rendimento". Sob o ponto de vista da produção, o resultado da utilização dessas sementes foram espetaculares. O México multiplicou por três suas colheitas de trigo em vinte anos. Os países asiáticos chegaram a acrescentar vinte milhões de toneladas anuais às suas safras de cereais (excluindo a China).

Com o passar do tempo, porém, começaram a surgir alguns problemas de produção relacionados a uma particularidade dessas sementes de laboratório. O especialista Ricardo Abramovay explica o que aconteceu:

"Sendo um produto da fabricação humana e da experiência de alguns anos de laboratório (e não dos milênios incorporados no processo de formação natural das sementes naturais), elas são bem menos resistentes a catástrofes naturais, pragas, insetos, etc. A adaptação de uma espécie animal ou vegetal a um determinado meio ecológico supõe a vitória sobre uma série de inimigos. Essas vitórias vão enriquecendo o patrimônio genético dessa espécie e permitem que ela sobreviva no ambiente onde foi formada. Com as sementes de laboratório ocorre exatamente o contrário: embora mais produtivas, elas não possuem as condições genéticas para enfrentar seus inimigos naturais. A variedade que consegue resistir a uma determinada velocidade dos ventos é, por exemplo, destruída por certos tipos de insetos. A que resiste a esses insetos sucumbe sob o efeito da temperatura local, e assim por diante. Em suma, a adoção em larga escala das variedades de alto rendimento representa um perigoso empobrecimento no patrimônio genético das espécies."

Identificado corretamente o problema, os cientistas não tiveram dúvidas quanto à melhor solução a ser adotada: utilização maciça de adubos e defensivos químicos. A partir daí, tornou-se prática corrente envenenar o solo e as lavouras com produtos químicos. Em 1960, os Estados Unidos venderam 22,7 milhões de dólares em fertilizantes químicos; em 1972 esse volume de vendas já atingia 143,7 milhões de dólares. Em trinta anos, a produção de pesticidas nos Estados Unidos cresceu 13 mil vezes...

Os desequilíbrios e os acidentes com pesticidas e fertilizantes multiplicaram-se em todos os países. Estima-se que a manipulação de agrotóxicos mate atualmente uma pessoa no mundo a cada 105 minutos. No Brasil, a média é de 14 mortes por intoxicação todos os dias.

As pragas atacadas com agrotóxicos tampouco ficaram impassíveis. Não só cresceram em número, como se tornaram resistentes a vários desses venenos químicos. Em 1958, o agrônomo brasileiro Adilson Paschoal havia constatado que 40 das principais culturas brasileiras eram atacadas por 193 pragas. Em 1976, dezoito anos mais tarde, ele observou que o número de pragas havia aumentado para 593, e justamente nas lavouras que mais receberam pesticidas. Entre 1960 e 1980, a quantidade de agrotóxicos utilizados nas lavouras passou de 70 para 610 e, segundo ele, "a produtividade física das principais culturas se manteve estagnada ou em muito lento crescimento."

Em 1987, o biólogo Felipe Brum, da Universidade de Minas Gerais, anunciava que dos 500 insetos considerados pragas na agricultura, 400 já eram resistentes a qualquer tipo de pesticida…

A crescente resistência das pragas aos agrotóxicos faz com que hoje sejam desenvolvidas substâncias cada vez mais poderosas, e também novos tipos de sementes, resistentes a esses produtos químicos.

Não é sem razão que duas das cinco maiores empresas do mundo comercializadoras de sementes são também companhias agroquímicas. No mundo todo existem hoje já 2,5 milhões de hectares de solo cultivados com plantas modificadas em laboratório… Atualmente desenvolve-se estudos visando a obtenção de variedades de algodão resistentes ao bronoxinil, uma toxina suspeita de afetar a saúde dos agricultores, enquanto que uma empresa química alemã desenvolveu plantas resistentes ao 2,4-D, um composto que comprovadamente causou câncer em lavradores. Já há variedades de milho, soja e algodão resistentes a herbicidas, e outras tantas resistentes a insetos. Há, inclusive, um tipo de tomate "longa vida", que dura até três semanas fora da geladeira...

O ambientalista russo Alexei Yablokov demonstrou que alguns pesticidas, mesmo em concentrações extremamente baixas, podem causar mudanças de comportamento em animais. Segundo ele, um pesticida chamado "sevin", utilizado numa concentração infinitesimal, pode mudar o comportamento de grandes cardumes de peixe, tornando seus movimentos desordenados.

Os poderosos herbicidas à base de "Picloram" permanecem no solo durante anos, e vão eliminando a vida nos rios e lagos para onde são carregados. Além de serem cancerígenos, suspeita-se que possam provocar deformações genéticas. Até ser definitivamente proibido, o conhecido DDT causou danos em todos os lugares onde foi utilizado. Abaixo, dois exemplos significativos:

  • Os grandes campos de alfafa e algodão do Arizona, Estados Unidos, receberam milhões de toneladas de DDT, que acabaram dizimando as abelhas. De um total de 108 mil colméias existentes naquele Estado em 1960 restam hoje apenas 20 mil.
  • Utilizado para matar mosquitos na Indonésia, o DDT eliminou também um certo tipo de vespas que se alimentavam de lagartas. Livres das vespas, as lagartas se multiplicaram sem controle e comeram as palhas que recobriam as casas, destruindo-as. Enquanto isso, as moscas que viviam dentro das casas absorveram o DDT e intoxicaram as lagartas que se alimentavam delas, as quais morreram ou perderam a velocidade. Locomovendo-se com lentidão, as lagartas tornaram-se presas fáceis de gatos, que ao se alimentarem delas também morreram. Sem gatos, os ratos se proliferaram livremente e invadiram facilmente as casas, cujos telhados de palha estavam destruídos, provocando uma epidemia de peste bubônica.

De acordo com o vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, recentes estudos demonstraram que o uso difundido de nitrogênio como fertilizante pode aumentar a falta de oxigênio e fazer com que o solo produza metano e óxido nitroso em excesso, gases esses que já respondem por 20% das causas do aquecimento global. Os fertilizantes também interferem com a diversidade genética, pois ao compensarem diferenças em meio ambientes locais e tipos de solo, desestimulam a diversidade entre as variedades de cultivo.

Um tratado poderia ser escrito sobre os efeitos danosos do ser humano nas práticas de cultivo dos alimentos que consome. O ser humano parece um Midas ao contrário: onde ele toca transforma ouro puro em metal enferrujado.

Qual a causa desse fracasso retumbante? Como sempre, a total ignorância do ser humano em relação à natureza e suas Leis, bem como a funesta suposição de poder resolver tudo com as limitadas capacitações do seu raciocínio. Nunca o intelecto será capaz de reconstruir a ponte que o próprio ser humano destruiu, a qual o ligava outrora à natureza com todos os seus entes.

A sistemática agressão humana à natureza é decorrência direta desse desligamento voluntário, que vem já de milênios. Poderá ainda causar surpresa que agora, no ajuste final de contas, em várias regiões da Terra, as colheitas sejam destruídas por secas infindáveis e chuvas torrenciais? Que as moradias de tantos seres humanos desapareçam sob furacões, tempestades de granizo, desmoronamentos e erupções vulcânicas?

Miséria e fome, em vários graus, aumentam em toda a Terra. Da subnutrição crônica à morte por inanição, da queda do padrão de vida à falta de moradia e vestuário, tudo fruto da atuação humana errada na Criação. Por isso, a cura dessas mazelas só virá quando o ser humano reaprender a viver de maneira certa. Isso acontecerá forçosamente após a consumação do Juízo Final. Assim como já fora no princípio3, a Terra voltará a ser um lugar paradisíaco. Não por obra do ser humano corrompido, mas por intervenção do Criador.

Vamos agora, numa rápida amostragem, verificar o que já produziram a fome e a miséria no mundo durante o Século do Juízo:

  • No início do século a fome atingiu milhões de pessoas na Índia, em decorrência de más colheitas.
  • A grande fome na China de 1959-61 dizimou um número estimado de 30 milhões de chineses.
  • Entre 1967 e 1970, mais de um milhão de biafrenses morreram de fome.
  • Em 1974, cerca de 300 mil africanos subsaarianos morreram de fome.
  • Entre 1984 e 1985, a fome voltou a assolar a África subsaariana: morreram cerca de dois milhões de pessoas, metade das quais etíopes.
  • Em 1992, enquanto 1,5 milhão de pessoas eram atingidas novamente pela fome na Etiópia, os alimentos enviados por entidades humanitárias internacionais eram confiscados pelos grupos armados em luta.
  • Em 1993, aproximadamente 600 mil pessoas morreram de fome no Sudão.
  • Em dezembro de 1995 tinha início a maior onda de fome dos últimos tempos na Coréia do Norte comunista, depois que chuvas torrenciais devastaram a agricultura do país, e continuaram durante o ano de 1996.
  • Em fins de 1997, a fome grassava numa das províncias da Indonésia e matava centenas de pessoas.
  • De acordo com um relatório divulgado pelo Departamento de Assuntos Humanitários da ONU, em abril de 1998, em pelo menos 20 países africanos a população se alimentava unicamente de raízes, folhas e frutos selvagens; nos períodos mais agudos, cerca de mil africanos morriam de fome diariamente.

Essas são algumas das "ondas de fome" que o mundo se acostumou a acompanhar de tempos em tempos. Todavia a fome segue matando de maneira endêmica em muitas regiões do globo. De acordo com dados da ONU, 20 milhões de crianças morrem de fome anualmente em todo o mundo; cerca de 37 mil crianças com menos de 5 anos morrem de fome diariamente.

Em 1996, o jornal The Washington Post, citando fontes da CIA, noticiou a ocorrência de casos de canibalismo na Coréia do Norte, perpetrados por camponeses desesperados de fome, enquanto que na capital, Pyongyang, eram vistas pessoas buscando ervas e raízes nos parques públicos para cozinhar e comer. Em fins daquele ano, o racionamento de alimentos atingia 90% da população, com rações diárias de 200 gramas, o equivalente a 600 calorias. Em fevereiro de 1997, os norte-coreanos dispunham em média de 100 gramas de arroz por dia, e a revista The Economist noticiava que cães, gatos e pombos praticamente haviam desaparecido das ruas do país, tendo sido devorados, e que mulheres estariam comendo a própria placenta após dar à luz... Em abril, o governo começou a adiar os enterros a fim de prevenir atos da canibalismo. Em julho, a Unicef informava que cerca de 800 mil crianças estavam a caminho da morte, vítimas da desnutrição; algumas já não tinham forças sequer para comer as rações enviadas pelos países desenvolvidos. Em agosto, cerca de 80% da população do país (19 milhões de pessoas) era constituída de esfaimados. Em setembro, a rede de notícias CNN informava que possivelmente dois milhões de norte-coreanos já haviam morrido de fome. Em outubro, um jornal de Hong Kong revelou que várias pessoas foram executadas sob a acusação de vender carne humana no mercado negro, e um oficial do exército que havia fugido do país declarou que alguns pais estavam matando seus próprios filhos para comê-los; naquele mês, os enterros não estavam acontecendo porque os parentes não tinham forças para fazê-los... Em janeiro de 1998, a ração diária per capita caiu para 58 gramas, e em fevereiro ela foi reduzida ainda mais. A Cruz Vermelha Internacional informou que cerca de 10 mil crianças morriam de fome todos os meses, e que mais de 5 milhões de norte-coreanos estavam à beira da morte por inanição.

"O maior assassino do mundo e a maior causa de doenças e sofrimento ao redor do golfo é… a extrema pobreza." Esta frase consta do Relatório Mundial da Saúde de 1995, editado pela OMS. Confirmando numericamente esses dados, a ONU informou, em 1996, que 60% da população mundial vivia com uma renda de até dois dólares por dia, das quais cerca de 1,3 bilhão de pessoas sobreviviam com até um dólar por dia…

Durante a Conferência Mundial de Alimentação realizada em Roma, em novembro de 1996, o órgão da ONU para agricultura e alimentação (FAO) divulgou um relatório sobre o número estimado de famintos no mundo: 800 milhões de pessoas apenas nos países em desenvolvimento — 215 milhões só na África subsaariana, correspondendo a 43% da população daquela região4 — e mais 200 milhões de crianças com menos de cinco anos sofrendo deficiências agudas por falta de proteínas e calorias.

Números espantosos, que, no entanto, são considerados incorretos pelo professor Peter Suedberg, da Universidade de Estocolmo, convencido de que na realidade eles são muito maiores. E o espanto fica ainda maior se juntarmos a isso uma estatística da OIT, informando que no início da década de 90 havia, apenas nas grandes cidades, cerca de 400 milhões de pessoas vivendo na pobreza, correspondendo a um terço da população urbana mundial. Segundo o Órgão, mantida a mesma tendência de crescimento da pobreza, esse número se elevaria a um bilhão até o final do século…

Várias organizações internacionais tentam já há tempos minorar o problema da fome e da miséria, através de campanhas. A FAO lançou a sua Campanha de Combate à Fome em 1960, com uma duração prevista de cinco anos.

No Brasil, em 1993, surgiu a "Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida", lançada pelo sociólogo Herbert de Souza. Essa campanha tomou forma depois que uma enquete do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas apresentou um estudo indicando que 9,2 milhões de famílias passavam fome no Brasil. De acordo com dados do Banco Mundial, o Brasil é considerado um país de renda média alta. Pode-se, assim, imaginar a situação de miséria e fome nos 91 países que apresentam renda per capita inferior à brasileira. No nosso país a disparidade da concentração de renda agrava ainda mais a situação. Na região mais pobre, no Nordeste, 51,2% da população situa-se abaixo da linha de pobreza. Em 1980, 10,6% dos menores de 17 anos do Nordeste viviam em famílias cujos chefes ganhavam menos de meio salário mínimo por mês; em 1991 esse número havia subido para 26,4%.

Nos países desenvolvidos tampouco a miséria foi erradicada, ou sequer mantida estabilizada. Nos Estados Unidos, que detêm há décadas o maior PIB do mundo, 11,4% da população era constituída de pobres em 1978; em 1989 esse percentual já era de 12,8%, e em 1992 subiu para 14,5%. Segundo o historiador Eric Hobsbawm, "em qualquer noite de 1993 em Nova York, 23 mil homens e mulheres dormiam na rua ou em abrigos públicos." No livro O Futuro do Capitalismo, Lester C. Thurow informa que em 1994 havia um grupo flutuante estimado em 600 mil pessoas que dormiam ao relento em qualquer noite nos Estados Unidos. De acordo com o sétimo informe anual sobre a pobreza mundial, divulgado em outubro de 1996 pela organização americana Pão para o Mundo, 25% das crianças americanas menores de 12 anos (13,6 milhões) passavam fome ou corriam risco de passar fome. E segundo ainda Lester C. Thurow, no ano de 1996, 32% de todos os homens entre 25 e 34 anos ganhavam menos que a quantia necessária para manter uma família de quatro pessoas acima da linha da pobreza.

Na Europa, os pobres já constituem 15% da população, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Na Alemanha, por exemplo, havia cerca de 850 mil desabrigados em 1995, e o número dos que procuravam ajuda oficial era 10% maior em relação ao ano anterior. Os números oficiais do governo alemão mencionavam 50 mil crianças vivendo nas ruas das grandes cidades; de 1981 a 1994, o número de crianças abaixo de 7 anos que precisavam de ajuda previdenciária quadruplicou, chegando a 571 mil em 1994.

Na Inglaterra, estima-se que haja entre 400 mil e 2 milhões de "sem-teto", designação essa que se imaginava até a pouco restrita aos países do terceiro mundo. Só em Londres, oito mil pessoas dormem nas ruas todas as noites. Em todo o país, o número de desabrigados e de pessoas em abrigos temporários é cinco vezes maior do que no início da década passada.

Na França, em 1994, havia um total estimado entre 600 a 800 mil sem-teto. Em 1995, o número de pessoas que receberam a chamada "renda mínima de inserção", um benefício concedido pelo governo para quem está há tanto tempo desempregado que perdeu o direito ao seguro-desemprego, mais que dobrou desde a sua criação, em 1988. O presidente da União Nacional dos Organismos Privados Sociais na França, René Lenoir, declarou: "Hoje a nossa sociedade assumiu a forma de uma ampulheta: no alto existe uma classe abastada de proprietários e pessoas que vivem, em geral, de renda; embaixo, aumenta o número de pobres."

Na América do Sul, a Argentina se destaca no crescimento da pobreza. Em outubro de 1996, 26,7% da população da Grande Buenos Aires estava vivendo abaixo da linha da pobreza, um aumento de 66% do número de pobres em dois anos…

Na Rússia, após a desintegração da União Soviética, a fome fez a população vender tudo o que lhe restava. "Nas escadarias do metrô ou estações ferroviárias, vendem-se latas de óleo, pães feitos em casa ou o corpo da filha mais nova." (O Estado de S. Paulo – 14.5.95) A produção caiu nesse país, de 1992 a 1995, mais do que em toda a Grande Depressão de 1929… A OIT estimava que havia na Rússia, em 1995, oito milhões de desempregados, enquanto que os que mantinham um emprego ganhavam salários irrisórios. Uma professora de nível médio, por exemplo, tinha um rendimento de cerca de 30 dólares mensais.

Em maio de 1996, descobriu-se que estudantes da Faculdade de Agricultura [ironia!] da cidade de Ussuriysk estavam roubando cobras e rãs do instituto para se alimentar, já que eram incapazes de fazê-lo com a ajuda de custo de 15 dólares mensais… Em outubro, o vice-primeiro-ministro Viktor Ilyushin, encarregado da política social, revelou que nada menos que um quarto da população da Rússia estava vivendo abaixo do nível mínimo de subsistência. Qualificando a situação social de "catastrófica", ele acrescentou que o nível de renda dos russos havia caído 40% nos últimos cinco anos… Em março de 1997, 80% da população russa estava vivendo na pobreza, segundo estimativa do ex-líder soviético Mikhail Gorbatchev. Em abril daquele ano, cerca de 10% da população (14 milhões de pessoas) era constituída de mendigos e prostitutas, conforme estimativa do Instituto para Problemas Sociais e Econômicos da Academia de Ciências.

De acordo com uma matéria jornalística, a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social, realizada na Dinamarca em março de 1995, com representantes de 150 países, "não apresentou nenhuma proposta original ou revolucionária de erradicação da pobreza." Aquela fora a 3ª megaconferência da ONU desde a ECO-92, no Rio de Janeiro, e de acordo com a reportagem, "como das duas vezes anteriores, não houve respostas prontas sobre o combate à pobreza. (…) O ressurgimento de desabrigados e mendigos é parte do forte crescimento de desigualdade social e econômica desta nova era, mesmo nos países ricos, cujo padrão de distribuição de riquezas entre a população não era considerado particularmente injusto."

Este, em largos traços, o retrato da fome e da miséria no mundo em nossa época, o Século do Juízo. Um sofrimento horrível, que atinge diariamente milhões e milhões de pessoas e que, no entanto, foi acarretado por elas mesmas. Esses acontecimentos terríveis, assim como tantos outros, deveriam ser encarados pela parte da humanidade ainda não atingida por eles como avisos e alertas gravíssimos, para que volte, ainda em tempo, a viver de acordo com as imutáveis e inflexíveis Leis da Criação.

Notas de Texto

1. A constatação do aumento progressivo da infertilidade humana, mencionada no tópico Economia, é um fenômeno relativamente lento e ainda não foi suficiente para reduzir a população mundial em termos absolutos. voltar
2. Em várias culturas agrícolas nota-se um aumento do excedente da produção (diferença entre produção e consumo). No caso do arroz, por exemplo, a média anual do excedente foi de 18,1 milhões de toneladas na década de 60; na década de 70 essa média pulou para 36,5 milhões de toneladas e na década de 80 chegou a 49,1 milhões de toneladas. voltar
3. Ver o livro Os Primeiros Seres Humanos, de Roselis von Sass. voltar
4. Em Angola, o salário médio mensal é de 40 mil kwanzas, o equivalente a meio dólar, suficiente para comprar um quilo de arroz. Há vários casos registrados de policiais que assaltam estrangeiros na rua, a fim de complementar seus salários de um dólar. voltar

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Pobreza
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Um dos mais graves problemas da humanidade em todos os tempos, a pobreza preocupou economistas como Adam Smith, que, na obra A riqueza das nações, de 1776, afirmou: "Nenhuma sociedade, cuja maior parte de seus membros são pobres e miseráveis, pode ser próspera e feliz."

Pobreza, em sentido genérico, é a carência de meios essenciais que garantam a sobrevivência. Em sentido estrito, as necessidades básicas são as que se referem à manutenção da vida; em sentido amplo, dependem do padrão de vida de cada comunidade. Assim, pode designar-se por pobre a pessoa cuja carência a situa à beira da morte, ou a pessoa cuja nutrição, moradia e vestuário, embora suficientes para a preservação da vida, têm qualidade inferior às da população em geral. A pobreza se define segundo parâmetros temporais e espaciais diversos.

Quando tem duração limitada e é generalizada, a pobreza se caracteriza como cíclica. Nos países de baixa industrialização, a incapacidade ocasional de prover as necessidades básicas decorre da escassez sazonal de alimentos, causada por fenômenos naturais ou mau planejamento agrícola. Nas nações industrializadas, em que o padrão de vida depende da capacidade da economia de gerar riqueza e emprego, tem origem em crises econômicas, como a depressão da década de 1930. Os efeitos das recessões econômicas-- altas taxas de desemprego e redução da produção e da renda nacionais -- afetam principalmente as camadas mais pobres da população, desprovidas de recursos alternativos de sobrevivência.

A insuficiência relativamente constante de meios de suprir as necessidades básicas chama-se pobreza coletiva. Pode ser genérica, quando descreve o padrão médio de vida de toda uma sociedade, ou concentrada em segmentos de uma sociedade próspera. No primeiro caso estão os países subdesenvolvidos, nos quais o conjunto da renda nacional não seria suficiente para manter as populações mesmo que fosse dividido igualmente por todos os cidadãos. Situam-se nesse quadro muitos países da Ásia, África e América Latina. No segundo, estão os grupos que vivem na periferia das grandes cidades americanas e européias, constituídas principalmente de trabalhadores imigrantes ou provenientes do meio rural. Em qualquer desses modelos, as populações atingidas têm baixa expectativa de vida, doenças causadas pela desnutrição e altas taxas de mortalidade infantil.

A pobreza individual, como a coletiva, tem caráter permanente, mas sua área de distribuição limita-se ao indivíduo ou família incapaz de prover suas necessidades, mesmo quando vive numa comunidade próspera. Pode ser gerada por impedimentos físicos ou psíquicos. A pobreza de classe é característica de uma camada social de baixo rendimento, mantida nessas condições pela discriminação racial, educacional, domiciliar e empregatícia. Em quase todas as sociedades nas quais há dois ou três grupos étnicos, é pobre o que está situado mais abaixo na escala social.

As sociedades modernas constataram que a pobreza não é um mal inevitável ou incontrolável e buscam atenuar seus efeitos com medidas de política social, como a implantação do estado de bem-estar e a defesa de programas econômicos baseados na distribuição mais justa da riqueza. Apesar dessas medidas, a pobreza não só persistiu como se agravou na segunda metade do século XX. Segundo dados da Organização das Nações Unidas, a proporção de pobres na população mundial continua muito alta, embora a riqueza das nações tenha se multiplicado diversas vezes.


Pobreza no Brasil
Realidade no país desde o período colonial, a pobreza agravou-se com o modelo desenvolvimentista adotado a partir da década de 1930, que, mesmo dando ênfase à industrialização, deixou intacta uma estrutura agrária obsoleta, em que a posse da terra é restrita a um número muito pequeno de pessoas, e incentivou um sistema concentrador de renda.

O período autoritário iniciado em 1964 manteve o modelo econômico nas décadas de 1970 e 1980, período que se caracterizou por diversas crises recessivas mundiais. A riqueza nacional aumentou, o processo agrícola e industrial sofisticou-se e abrangeu as mais diversas áreas produtivas, entre elas as de tecnologia de ponta. O quadro social, porém, agravou-se. O êxodo rural levou a uma urbanização desordenada. Um grande contingente de desempregados, que Karl Marx chamou de "exército industrial de reserva", instalou-se nas periferias das cidades, geralmente em áreas de risco como os morros do Rio de Janeiro, e voltou-se para atividades marginais, fora da cadeia produtiva legal. As cidades incharam, os espaços urbanos se degradaram e a miséria passou a fazer parte do cotidiano das populações urbanas e rurais. Existem em todo o país áreas em que a miséria é a norma, não a exceção, como em muitos municípios do Norte e do Nordeste e em bolsões localizados em estados ricos como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

O processo de redemocratização na década de 1980 coincidiu com o despertar da consciência nacional para a presença ostensiva da face mais trágica da miséria -- a fome endêmica, que atinge milhões de pessoas e deixa marcas indeléveis, como o nanismo que se constata nas populações do Nordeste. O combate à miséria, suas causas e efeitos, tornou-se o grande tema social e político de discussão e engajamento da sociedade civil e das instituições de governo na década de 1990.
Pobreza 0

A campanha Pobreza Zero é uma campanha de sensibilização da sociedade portuguesa para a luta contra a pobreza. Inserida na campanha internacional Global Call Against Poverty, presente em 92 países, é gerida em Portugal por uma coligação de organizações e com o secretariado na oikos.

Com os milhares de adesões, assinaturas do manifesto e das cartas aos ministros, a organização pretende conseguir criar um movimento global de pressão política que leve os decisores mundiais a tomar medidas concretas de combate à pobreza e de diminuição das desigualdades sociais.

Já provámos que o nosso planeta tem recursos suficientes para todos! Falta apenas tomar a decisão que vai acabar com a pobreza extrema e cumprir finalmente com os Objectivos do Milénio Adobe PDF


Muitos milhões de vozes juntas podem conseguir mudar alguma coisa. A tua voz também conta. Junta a tua voz!

SANTARÉM NA LUTA CONTRA A POBREZA

A delegação de Santarém da Rede Europeia Anti-Pobreza (REAP) apresenta esta segunda-feira um projecto de educação cívica nas escolas do distrito, que prevê a entrega de kits, denominados "bagagem da cidadania", com vários instrumentos pedagógicos para os alunos.

O kit inclui jogos, material didáctico, propostas de projectos e documentação vária e será entregue a cada uma das escolas que aderirem à iniciativa, explicou Ricardina Reis, técnica-executiva da delegação.

Para a apresentação do projecto, que conta com o apoio do Governo Civil de Santarém, foram convidadas escolas, associações de pais e Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) que trabalham no pré-escolar.

Saber os seus direitos, requerer apoios, preencher formulários ou procurar informações são alguns dos problemas que muitos pobres apresentam e que os impedem de ter uma efectiva integração social.
Esta situação perpetua casos de carência económica que são também problemas de integração social, considerou Ricardina Reis.

Estas acções pedagógicas vão versar os temas da multiculturalidade, solidariedade, educação ambiental e direitos e deveres do cidadão e Ricardina Reis espera que os professores "criem novos conteúdos" que possam ser utilizados nos anos seguintes.

POBREZA

As profundas desigualdades na distribuição da riqueza no mundo atingiram actualmente proporções verdadeiramente chocantes.

O número de pobres não pára de crescer e já chega a 307 milhões de pessoas no mundo. Relatório da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) recentemente publicado mostra que nos últimos 30 anos o número de pessoas que vivem com menos de US$ 1,00 duplicou nos países menos desenvolvidos.

Para a agência da ONU, o dado mais preocupante é a tendência de que esse número aumente até 2015, quando os países menos desenvolvidos poderão passar a ter 420 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza.

Em algumas regiões, principalmente na África, parte da população já tem um consumo diário de apenas 57 centavos de dólares, enquanto um cidadão suíço gasta por dia US$ 61,9. Nos anos 70 cerca de 56% da população africana vivia com menos de US$ 1,00, hoje este valor é de 65%.A pobreza está a aumentar, em vez de diminuir

As ajudas dos países mais ricos aos mais pobres são uma gota de água no Oceano, cifrando-se 0,22 por cento do seu PIB. O mais grave é todavia os subsídios que atribuem às suas empresas para exportarem e barreiras comerciais que levam aos produtos oriundos dos países mais pobres. O desequilíbrio de meios sufoca completamente as economias mais pobres.

Calcula-se que 815 milhões, em todo o mundo sejam vítimas crónica ou grave subnutrição, a maior parte das quais são mulheres e crianças dos países em vias de desenvolvimento.

O flagelo da fome atinge 777 milhões de pessoas nos países em desenvolvimento, 27 milhões nos países em transição (na ex-União Soviética) e 11 milhões nos países desenvolvidos.


A subnutrição crónica, quando não conduz apenas à morte física, mas implica frequentemente uma mutilação grave, nomeadamente a falta de desenvolvimento das células cerebrais nos bebés, e cegueira por falta de vitamina A. Todos os anos, dezenas de milhões de mães gravemente subnutridas dão à luz dezenas de milhões de bebés igualmente ameaçados.

Utopias

Oficialmente as utopias estão mortas, mas a realidade que as alimentou e justificou durante séculos continua bem viva. As desigualdades em todo o mundo, desde o "triunfo" do liberalismo nos anos oitenta, são cada vez maiores. O esbanjamento de recursos nos países mais ricos está a conduzir a humanidade para a sua própria extinção. Como refere Peter Singer, bastava que nestes países, se deixassem de alimentar os animais domésticos à base de cereais e de soja, e estes alimentos fossem distribuídos pelos necessitados, para se pôr fim à fome no mundo.

MUNDO NOBRE DE CORAÇÃO POBRE


Hoje fico a pensar
De onde vem tanta pobreza?
De males que conduzem a terra
Que tanta arrogância tem a nobreza?

Ser de cor é preconceito
Ser de raça não prevalece a educação
O planeta está de ponta cabeça
Por que tamanha indignação?
A guerra dominou o mundo
Se luta por terra, água e fortaleza
Pobre do ser que sente-se incapaz
Que vive sem armas, somente com delicadeza

Hoje, que mundo é este?
Por que grande é a sombra em nossa sociedade?
O que falta não é poderÉ apenas falta de oportunidade
Carcaças e alimentos jogados ao chão
Mundo global de tamanha plenitudeDe fortunas, imensidões ao montes
De covarde e branda atitude

A arma do pobre é a glória
Vive na sede de vencerCrianças pobres e inocentes
Morrem de fome sem ao menos crescer
Sonhos são jogados na esquina
Meninos e meninas esbarram-se no farol
Vivem no medo escuro do tempo
Como iscas jogadas ao anzol
Só resta o desejo de um sonho
Matar a gana da compaixão
De um mundo materialista
Onde o vírus do ódio ataca sem perdão
Que o falar não tenha um idioma
Que o lugar seja para todos um igual
Que o preto e o branco seja colorido
E a justiça para todos seja um ideal

Que tempos melhores possam vir
Venham dias de brilho, aconchego e calor
Que o futuro seja mais do que verdadeiro
O mais triste de tudo é saber que EU tenho culpa nisso!